quinta-feira, 15 de março de 2007

[...CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE...]




















Poema de sete faces


Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra

disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,

não houvesse tantos desejos.


O bode passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.

Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode

é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.


Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.

Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.


Eu não devia te dizer

mas essa lua mas
esse conhaque

botam a gente comovido como o diabo.

Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)

Sem comentários: